APRESENTAÇÃO
TURISMO DE BASE COMUNITÁRIA: REFLEXÕES TEÓRICAS E EXPERIÊNCIAS BRASILEIRAS
Abstract
O dossiê Turismo de Base Comunitária: reflexões teóricas e experiências brasileiras surge como mais uma coletânea de estudos acadêmicos voltada a dar visibilidade a iniciativas e a esforços coletivos que objetivam colocar em prática um outro fazer turístico, socialmente mais justo, baseado na autogestão comunitária.
Há mais de três décadas, iniciativas de Turismo de Base Comunitária (TBC) no Brasil vêm despontando com pouco ou nenhum apoio governamental, envolvendo especialmente povos originários, comunidades tradicionais, produtores da agricultura familiar, assentamentos da reforma agrária e comunidades de favelas. Essas comunidades, que historicamente estiveram à margem das políticas públicas de turismo, são, em grande medida, responsáveis pela enorme diversidade e riqueza cultural do país, além de contribuírem de forma expressiva para a preservação ambiental e para a segurança alimentar.
Desta forma, pode-se afirmar que o Turismo de Base Comunitária tem emergido majoritariamente em comunidades que se encontram em situação de vulnerabilidade econômica, social, política e territorial, as quais buscam no turismo formas de subsistência, resistência e visibilidade para seus modos de vida, lutas e direitos.
Como já existem registros de iniciativas de TBC por todo território nacional, o presente dossiê buscou reunir estudos de caso representativos das cinco regiões do Brasil. Dos 13 artigos selecionados, 10 abarcam experiências localizadas no Amazonas, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Paraná, Piauí, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte. O dossiê também contempla uma diversidade de grupos sociais em análise, com estudos sobre TBC em comunidades indígenas, quilombolas, caiçaras, extrativistas, comunidades rurais e produtores da agricultura familiar. De forma complementar, três artigos do dossiê trazem uma análise mais panorâmica do TBC no país.
O artigo intitulado Turismo de base comunitária: breve revisão de escopo em teses e dissertações (2004-2024), de Itamar Freitas (UFS), Maria José Nascimento Soares (UFS), Fábio Alves dos Santos (UFS) e Núbia Dias dos Santos (UFS), inventaria e descreve a produção acadêmica brasileira sobre TBC dos últimos 20 anos, apontando o crescimento progressivo do tratamento desse tema nos programas de pós-graduação, em especial nas universidades públicas.
João Paulo da Silva (UFPE), em seu artigo Desafios de acesso ao mercado das iniciativas brasileiras de turismo de base comunitária, identifica as dificuldades das experiências de TBC em se integrar ao mercado turístico, com foco nos projetos apoiados pelo edital do Ministério do Turismo de 2008.
O artigo sob o título O turismo de base comunitária e o patrimônio cultural: reflexões, usos e apropriações, de Almir Félix Batista de Oliveira (UFRN), examina as relações entre o Turismo de Base Comunitária (TBC) e o Patrimônio Cultural (material e imaterial), refletindo sobre a apropriação histórica do patrimônio pelo turismo. O trabalho aborda o TBC como uma alternativa turística, discutindo suas definições, histórico e exemplos de comunidades que utilizam seu patrimônio nessa prática.
Lana Mignone Viana Rosa (ISA), Susy Rodrigues Simonetti (UEA), Luciana Yucari Uehara (ICMBio), Marcos Wesley de Oliveira (ISA) e Erica Vilela Figueiredo (Yanomami), com o trabalho Yaripo Ecoturismo Yanomami: gestão comunitária e articulação interinstitucional na visitação ao Pico da Neblina (AM), Brasil, analisam os desafios do turismo em terra indígena e o papel das parcerias institucionais nesse contexto, enfatizando a necessidade do turismo contribuir para assegurar os modos de vida no território Yanomami, em contraposição ao garimpo ilegal.
No artigo, Turismo indígena na Aldeia Babaçu: a experiência terena no Pantanal de Mato Grosso do Sul sob o olhar do visitante, Dionatan Miranda da Silva (UFGD), Edvaldo Cesar Moretti (UFGD) e Denise Silva (Bruaca) exploram as perspectivas dos visitantes em busca de experiências culturais na aldeia Terena Babaçu, situada na Terra Indígena Cachoeirinha, no município de Miranda/MS.
Anadia Teresa Soares de Araújo (UESPI), Sarany Rodrigues Fernandes (UESPI) e Antonio Rafael Barbosa de Almeida (UESPI), em Turismo étnico na comunidade quilombola Mimbó em Amarante-PI, investigam as dinâmicas, as possibilidades e os entraves do turismo étnico em uma comunidade quilombola no estado do Piauí, destacando sua importância no fortalecimento identitário e no engajamento comunitário.
Outro estudo que direciona seu olhar para uma comunidade quilombola é de autoria de Daciléia Lima Ferreira (UEMA), Gilmar Santana (UFRN) e Josenildo Campos Brussio (UFMA), sob o título Turismo de base comunitária na comunidade quilombola da Vila das Almas, em Brejo/MA: possibilidades e avanços. O trabalho faz uma imersão nos saberes griôs, presentes nas narrativas orais, na memória coletiva, no imaginário e nas representações simbólicas da comunidade, como condições possíveis para desenvolver o TBC.
No trabalho intitulado Organizadores sociais e turismo de base comunitária: um estudo das comunidades rurais da região do Cariri Paraibano, Jakson Braz de Oliveira (UFBA) e Carolina Todesco (UFRN) analisam como duas comunidades rurais, situadas no interior da Paraíba, estão socialmente organizadas e integradas à cadeia produtiva do turismo, revelando os fatores que explicam suas diferentes formas de organização comunitária e proximidade com o desenvolvimento do TBC, a partir da teoria de organizadores sociais da psicologia comunitária.
Thiago Chagas de Almeida (UFV), Magnus Luiz Emmendoerfer (UFV), Marcos Eduardo Carvalho Gonçalves Knupp (UFOP) e Lénia Marques (EUR), no trabalho intitulado Potencialização do “interesse pela comunidade” pela participação de cooperativas do turismo de base comunitária na governança pública territorial: uma análise em Paraty/RJ, buscam avançar no entendimento de como os benefícios do cooperativismo para comunidades podem ser intensificados pelo TBC em instâncias de tomada de decisão coletiva centrais para o desenvolvimento local.
Eloise Silveira Botelho (Unirio), Andressa dos Santos Dutra (Unirio), Marília Luísa de Oliveira (Unirio) e Douglas Cardoso Martins (UFRRJ), no artigo Monitoramento participativo do turismo de base comunitária na Área de Proteção Ambiental de Guapi-Mirim (RJ), apresentam os resultados de uma ação de pesquisa e extensão, apoiada pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade - FUNBIO, que desenvolveu metodologia para monitorar, de forma participativa, a visitação promovida por iniciativas de TBC que ocorrem em uma unidade de conservação no estado do Rio de Janeiro.
Com foco também em um projeto de extensão, Rosalma Diniz Araújo (UFPB) e Fabiane Nagabe (UFPB), no artigo Ciranda de Encontros: roteiros turísticos, troca de experiências e práticas do turismo de base comunitária na Paraíba, relatam os encontros, os diálogos e as trocas entre as comunidades envolvidas com o TBC no estado da Paraíba, nos anos de 2023 e 2024.
Êndel Raul Pachêco da Costa (UFRN) e Marcelo da Silva Taveira (UFRN), em Turismo de base comunitária e desenvolvimento regional: a experiência dos Geofoods no Seridó Geoparque Mundial da Unesco, em um recorte territorial que abarca seis municípios do interior do Rio Grande do Norte, identificam e analisam os processos de registros de Geofoods e suas repercussões no desenvolvimento do turismo regional relacionado ao TBC.
Por fim, o trabalho sob o título Inclusão social de jovens, mulheres e idosos por meio do turismo de base comunitária em comunidades do estado do Paraná, de Juliana Carolina Teixeira (Unespar) e Patrícia Denkewicz (Unesp), busca cobrir uma lacuna de pesquisa sobre turismo de base comunitária e inclusão social, com foco nos debates sobre as relações de gênero e geracionais, em cinco comunidades tradicionais situadas em diferentes regiões do estado do Paraná.
Como organizadores do dossiê, acreditamos que essa diversidade de trabalhos com diferentes olhares e perspectivas analíticas sobre o TBC corrobora para o debate e os avanços sobre o tema na academia, na arena política, no mercado turístico e, especialmente, nas comunidades interessadas em tornar o turismo um aliado às suas formas de re-existência.
